domingo, 19 de julho de 2009

Cenas reencontradas mudam forma de ver "Metrópolis", diz restauradora




Fonte: http://www.dw-world.de/dw/article/0,,4494477,00.html
Deutsche Welle: Uma versão completa de Metrópolis, de Fritz Lang, foi descoberta em 2008 na Argentina. Você trabalhará na restauração digital do filme, na Fundação Friedrich-Wilhelm Murnau de Wiesbaden. O que é tão importante assim nessa versão longa?
Anke Wilkening: Todas as versões que conhecemos hoje são consideravelmente mais curtas. O filme foi originalmente cortado em aproximadamente 30 minutos pela Paramount, e os estúdios UFA [Universum Film AG] igualmente o abreviaram de forma semelhante para a distribuição na Alemanha e exportação, cerca de quatro meses após a estreia alemã. Os distribuidores decidiram que ele era longo demais por razões econômicas. A restauração da meia hora que falta mudará completamente o filme em relação à forma como o conhecemos até agora.
Quando se encurta uma película, é mais fácil eliminar cenas envolvendo personagens secundárias do que protagonistas, e foi precisamente isso o que ocorreu com Metrópolis. Neste caso, três coadjuvantes masculinos – muito importantes para a obra por sua relação com uma das personagens principais, Freder – foram quase eliminados, reduzidos à figuração. Em todas as versões anteriores a relação ficara sempre obscura.
Metrópolis é muito bem documentado, temos o roteirosde Thea von Harbou, a partitura de Gottfried Huppertz, temos numerosas fotografias, as críticas da estreia. Portanto era fácil imaginar como essas cenas teriam sido. Mas ter a metragem original é bem diferente.
De que forma a versão editada modificou a mensagem de Lang?
Metrópolis parecera sempre um filme muito bombástico, uma estranha mistura de ficção científica e outras coisas. Agora toda a estrutura narrativa mudará. Fritz Lang aborda aqui seu tema favorito: a amizade entre homens e como ela fracassa.
Como ocorre a restauração digital? Pode explicar a técnica?
Em 2001, a Fundação Murnau já realizara uma restauração digital de Metrópolis, baseada nos negativos de câmera remanescentes. Na época, não era possível restaurar o filme completo, claro. Os negativos foram escaneados em resolução de 2K [2.048 pixels na horizontal], e esses arquivos serão a base para a nova restauração. Escanearemos as duplicatas em 60 mm que se encontram agora em Wiesbaden, as restauraremos o máximo possível e as integraremos nos arquivos digitais de 2001.
Então, restaurar o filme significa escanear e armazenar no computador?
Esse é o primeiro passo para tudo o que seja novo na versão da Argentina. O seguinte, e mais difícil, é a correção digital dos estragos. A cópia está em péssimo estado, e é só uma duplicata. Após a distribuição na Argentina, o original fora exibido em cinematecas por um colecionador particular, até a década de 1960. Como pode imaginar, ele estava realmente gasto, após mais de 35 anos de projeções.
Todos os defeitos no material foram copiados na duplicata de 60 mm, o que significa que são agora parte da imagem. É muito difícil, mesmo na restauração digital, lidar com esse tipo de dano. O problema mais sério são linhas que atravessam todo o quadro, da esquerda para a direita. E temos problemas de estabilidade de imagem. Toda a sujeira da cópia foi também reproduzida.
Também enfrentamos alguns problemas de contraste. A cada nova geração de um elemento fílmico, há sempre perda de nitidez e contraste e um aumento de granulação.
Mas há programas de computador capazes de corrigir esses defeitos?
Esperamos poder melhorar o contraste, aumentar a estabilidade e provavelmente eliminar parte da sujeira. Mas contamos que o dano sério, as linhas horizontais, permanecerão mais ou menos. Estão sendo realizados testes em diferentes laboratórios, para ver o que se pode alcançar no campo digital. Aí temos que decidir, antes de tudo, qual deles será encarregado da restauração, em segundo lugar, até que ponto vamos interferir no filme.
Metrópolis é considerado um clássico, e muitos estudantes de cinema têm que assisti-lo. Qual é a sua relevância para o ensino?
Por um lado, Fritz Lang é um dos mais importantes diretores alemães (austríacos), mesmo internacionais, da era do cinema mudo. Metrópolis é muito típico de sua época. A UFA estava tentando competir com os Estados Unidos, ostentando a técnica elaborada que tinha à disposição. É também uma mescla dos problemas mais cruciais daquele tempo: questões políticas e ideológicas se misturam e se fundem nessa película. Encontram-se elementos de ficção científica, romance, combinados à tecnologia avançada dos estúdios da UFA.
Ele foi um modelo cinematográfico por longo tempo. Há elementos de Metrópolis em muitos filmes de ação, como Blade Runner e O quinto elemento; mesmo em videoclipes como Express yourself da Madonna, ou Radio Gaga do Queen. Ou a ideia do cientista louco, que foi um modelo para os filmes de terror da Universal na década de 30.
O outro motivo é que essas cenas preciosas estiveram perdidas por tanto tempo. E tantas pessoas diferentes reviraram arquivos por todo o mundo, procurando seriamente esses 30 minutos, por razões científicas, sensacionalismo, ou por mera curiosidade. Sempre houve especulações sobre essa cena, e como ela poderia modificar o filme. E esta é uma razão importante por que Metrópolis é tão famoso.
Versão original de "Metrópolis", de Fritz Lang, descoberta na Argentina
O legendário filme expressionista Metropólis (1927), dirigido por Fritz Lang, foi a mais dispendiosa produção cinematográfica alemã da época, rodada pela Ufa como um desafio a Hollywood. No entanto, o efeito esperado não se concretizou.
Após o lançamento ter desagradado crítica e público, representantes da distribuidora norte-americana Paramount encurtaram o filme e simplificaram o enredo radicalmente, cortando cenas fundamentais do original. A versão director's cut ficou nas telas somente até maio de 1927 – e desde então foi considerada extraviada.
Cenas desconhecidas e mais dramáticas
Uma descoberta inédita no Museo del Cine, em Buenos Aires, trouxe à tona a versão original dada por perdida, segundo relatou o semanário alemão Die Zeit. A cópia – um quarto mais longa que a versão conhecida hoje – foi submetida pela diretora do museu ao parecer de três especialistas e confirmada como o original de Fritz Lang.
O filme sobre a cidade do futuro Metrópolis, cujos trabalhadores são condenados a viver no subterrâneo, narra a história de amor entre o filho de um industrial e uma operária, enfocando a luta de classes e o totalitarismo com imagens que se tornaram emblemáticas.
Segundo o relato do Die Zeit, Metropolis ganha uma outra dimensão com as cenas posteriormente cortadas. O papel dos protagonistas, por exemplo, só se tornaria realmente compreensível no contexto original. Outras cenas, como a do resgate das crianças da cidade subterrânea, seriam muito mais dramáticas.
A cópia recém-descoberta foi parar em Buenos Aires através da distribuidora argentina Terra, em 1928. Logo depois, um crítico de cinema adquiriu-a para seu arquivo pessoal, onde ela ficou guardada até a década de 1960.
Longo trajeto da cópia perdida
Com a venda dos rolos do filme ao Fundo Nacional das Artes da Argentina, a versão original de Metrópolis chegou a uma instituição pública, mas ninguém suspeitava de sua importância.
Em 1992, os rolos foram incorporados à coleção do Museo del Cine, cuja direção foi assumida por Paula Félix-Didier em janeiro passado. Seu ex-marido, diretor do departamento de cinema do Museu de Arte Latino-Americano, foi quem aventou a hipótese de tratar-se de uma cópia desconhecida de Metrópolis, após ter ouvido o diretor de um cineclube dizer quanto tempo a projeção do filme havia durado. Ao assistirem a essa versão, Félix-Didier e seu ex-marido descobriram cenas desconhecidas até então.
A película do Metrópolis reencontrado está arranhada e, após 80 anos, carece de restauração. Mas os especialistas garantiram que todas as cenas ainda estão perfeitamente visíveis.

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